Opinião

As novas regras de faturamento para consumidores B Optante: Uma visão jurídica das Resoluções Aneel e a Lei 14.300

Em artigo, Thiago Bao Ribeiro analisa os cenários enfrentados pelos consumidores com as recentes mudanças na legislação sobre faturamento para optantes dos Grupos A e B e os impactos para o setor de geração distribuída

Por Thiago Bao Ribeiro

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A legislação brasileira tem passado por mudanças significativas no setor de geração distribuída, especialmente no que diz respeito às condições de faturamento para consumidores dos Grupos A e B. Neste artigo, analisaremos as recentes alterações na Lei 14.300 e nas Resoluções Normativas 414, 1.000 e 1.059, destacando seus impactos para os consumidores de energia elétrica e para o segmento de geração distribuída.

Contexto das Mudanças Legislativas

A Resolução Normativa 414, de 2010, previa no artigo 100, inciso I, que o consumidor do Grupo A poderia optar pelo faturamento do Grupo B, desde que se enquadrasse na seguinte situação: a potência nominal total dos transformadores fosse igual ou inferior a 112,5 kVA.

Posteriormente, a Resolução 1.000, de 2021, também previu essa possibilidade no artigo 292. Além disso, a Lei 14.300 tratou da possibilidade de consumidores com geração distribuída, em média tensão, optarem pelo faturamento do Grupo B, desde que a geração fosse local e a soma das potências nominais dos transformadores da unidade consumidora fosse menor ou igual a 112,5 kVA (§1º, do art. 11 da Lei 14.300).

Finalmente, a Resolução 1.059 regulamentou a Lei 14.300, inserindo o §3º e incisos no artigo 292 da Resolução 1.000, trazendo uma nova exigência no inciso III, não prevista anteriormente. Além da geração local e do transformador menor ou igual a 112,5 kVA, o novo regulamento proibiu que a unidade consumidora com geração distribuída não aloque ou receba excedentes de energia de unidade consumidora distinta de onde ocorreu a geração de energia elétrica.

Se não bastasse a criação de uma nova regra para o enquadramento do B Optante, o artigo 671-A da Resolução 1.059 determinou que as distribuidoras notificassem os consumidores que não se enquadrarem nas regras do §3º do art. 292.

Com isso, logo após a publicação da Resolução 1.059 as distribuidoras dos quatro cantos do Brasil enviam as notificações para os consumidores B Optante, determinando as adequações no sistema em um prazo de 60 dias.

Aneel, o agente do "caos"

Desde a promulgação da Lei 14.300, o setor de energia elétrica vive uma insegurança jurídica, pois a norma que viria para assegurar o direito do consumidor que gera a sua própria energia foi inicialmente marcada por inúmeras lacunas que seriam preenchidas pelo regulamento da Aneel.

O regulamento somente saiu em fevereiro de 2023, após um ano de publicação da Lei. Durante esse período, o segmento de geração distribuída conduziu os seus negócios e investimentos a partir de interpretações chanceladas pelas distribuidoras.

No caso do B Optante, muitos consumidores do Grupo A realizaram investimentos em usinas remotas para suprir o consumo de energia da sua unidade consumidora de média tensão, optante pelo faturamento do grupo B. Nestes casos, os consumidores recebem excedente de energia de outra unidade consumidora do mesmo titular.

Há outros diversos casos em que os consumidores instalaram usinas de geração local, porém, com geração excedente que será compartilhada com outra unidade do consumidor gerador com a mesma titularidade.

Registre-se, ainda, os casos de consumidores que se conectaram com consórcios ou cooperativas de geração distribuída para fins de optarem pelo faturamento do grupo B.

Todos esses consumidores receberam a citada correspondência da distribuidora local para se enquadrarem nas novas regras.

A carta da distribuidora instaurou o "caos" no setor, uma vez que o consumidor realizou um investimento expressivo, que pode variar de R$ 300 a R$ 450 mil, para construir uma usina de geração distribuída e agora se vê obrigado a desconstruir seus planejamentos energético e financeiro para se enquadrar em uma norma eivada de ilegalidade.

A intenção de optar pelo faturamento do grupo B, para quem está no Grupo A, é única e exclusivamente financeira. Agora, esse planejamento deve ser desfeito e o consumidor que se vire para resolver o imbróglio criado pela Aneel.

Quem vai resolver esse caos? Somente os homens de capa preta, que neste caso são os homens de togas pretas, os juízes de direito.

Análise Jurídica e Impactos para os consumidores geradores B optante

Com base na evolução da legislação aplicável as questões levantadas neste artigo, apresento o seguinte entendimento jurídico sobre a situação do consumidor B Optante:

Situações antes da publicação da Lei 14.300

Os consumidores do Grupo A que fizeram opção pelo faturamento do Grupo B e que geram a sua própria energia no local de consumo (autoconsumo local) ou local distinto do local de consumo (autoconsumo remoto), independentemente se alocam ou recebem de excedentes de energia em unidade consumidora distinta de onde ocorreu a geração de energia elétrica, têm direito a se manterem como Optante B, pois a regra do inciso III, do §3º, do artigo 292, não pode retroagir para atingir direito consumado no passado (direito adquirido).

Situações após a publicação da Lei 14.300

Os consumidores B Optante que geram a sua própria energia no local de consumo (autoconsumo local), independentemente se alocam ou recebem de excedentes de energia em unidade consumidora distinta de onde ocorreu a geração de energia elétrica, têm direito a se manterem como B Optante, pois a regra do inciso III, do §3º, do artigo 292, não estava prevista na Lei 14.300 e não pode retroagir para atingir direito consumado no passado (direito adquirido).

No entanto, os consumidores B Optante e geram a sua própria energia em local distinto do local de consumo (autoconsumo remoto ou geração compartilhada), independentemente se alocam ou recebem de excedentes de energia em unidade consumidora distinta de onde ocorreu a geração de energia elétrica, não têm direito a se manterem como Optante B, pois a Lei 14.300 previu que a condição seria a geração local.

Conclusão

As recentes mudanças na legislação brasileira sobre faturamento para consumidores dos Grupos A e B trouxeram novas condições e critérios que impactam o setor de geração distribuída.

A terceira exigência presentes no §3º, do art. 292 da Resolução 1.000, inserida pela Resolução 1.059 não consta na Lei 14.300/2022, tampouco nos regulamentos anteriores à Lei. Com isso, essas novas imposições podem ser consideradas uma violação aos atos jurídicos perfeitos e aos direitos adquiridos de milhares de consumidores que investiram em sistemas de geração. Isso ocorre porque eles realizaram negócios jurídicos com terceiros sob uma normatização específica e agora são obrigados a cumprir um novo regime compulsório e inesperado, que os coloca em uma posição financeiramente desfavorável.

A análise jurídica apresentada destaca os diferentes cenários enfrentados pelos consumidores, dependendo de quando a opção pelo faturamento do Grupo B foi feita e das características específicas de cada caso.

É importante que os consumidores e profissionais do setor de energia renovável estejam cientes dessas alterações e avaliem cuidadosamente como elas podem afetar suas operações e tomada de decisões.

A recomendação que se faz nesses casos é de que os consumidores que receberam comunicados das distribuidoras exigindo a contratação de demanda consultem um advogado especializado em direito energético para avaliar a possibilidade de questionar a legalidade dessas cobranças e defender seus direitos, por meio de uma ação judicial declaratória de inexistência de débito.

A medida judicial deverá ser proposta em face da distribuidora, pois é quem aplica a norma ilegal e se beneficia dos valores cobrados dos consumidores.

Thiago Bao Ribeiro é advogado e sócio do escritório Bao Ribeiro Advogados, com foco em estruturação jurídica de projetos de geração de energia renovável

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